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sábado, 30 de maio de 2009

Sincronia

Como a lua e as estrelas
Pela noite à brilhar,
Como o peixe destemido
Que se perde pelo mar.

Como as flores pelos campos,
Como a planta e a raiz;
Majestoso é seu encanto,
Seu perfume em meu nariz!

Somos trem e passageiro,
Na estação à esperar,
A distância nos tortura,
Mas os passos sempre almejam se cruzar!

Duas almas que se assistem,
Corações em rendição,
Esperando o momento...
A perfeita condição!

Todo medo já não existe,
Ansiedade em seu lugar;
São dois lábios entreabertos,
Tão frenéticos; despertos!
Desejando para sempre se encontrar.

Foto por: Tuane Eggers

sexta-feira, 29 de maio de 2009

Soneto do amor mudo


Amor aquele que não ouso dizer o nome,
Que me devora, que machuca e que consome!
Amor aquele que arranca, que levanta e que acende,
Que tortura... Amor aquele que censura, em estado renitente.

Amor àquele que não ouso dizer o nome,
Que é crescente e progressivo;
Que me prende e faz de mim refém,
De seu próprio esplendor e gigantismo.

Amor aquele que não ouso dizer o nome,
Que me perverte...
Amor aquele que me diverte e faz-me morrer.

Amor aquele que insiste em permanecer mudo,
Que revela-se e para mim é tudo,
Absoluto sobre todo o meu querer.


Foto por: Tuane Eggers

quinta-feira, 28 de maio de 2009

Soneto do desejo

Tudo o que eu queria era abraçar-te desesperadamente...
Apertado... Envolvente!
Sentir tua respiração acariciar minha nuca,
E gritar bem alto as palavras que me sufocam e fazem teu ego estremecer.

Tudo o que eu queria era dar-te o tapa,
Com a força da mão massacrada,
Com a raiva do ciúme infundado,
Com o ódio que arrependido, se recusa a ficar.

Tudo o que eu queria era beijar-te nos lábios,
Com o amor intenso e incendiado,
Com o apetite voraz de um desejo sem limites.

Tudo o que eu queria era liberdade de te odiar.
Mais ainda, queria a prisão de poder te amar!
Fugir. Mas os pés teimosos sempre insistem em voltar.

Foto por: Tuane Eggers

quarta-feira, 27 de maio de 2009

A monotonia e o mundo

Hoje acordei estranho... Sentimento clássico de vazio existencial, sabe? E foi exatamente por estar tomado por um sentimento tão blasé, que eu despi minha alma diante desses lápis e caderno.
Blasé... Démodé... Palavras tão estrangeiras quanto este grito adolescente por algo que não entendo.
Talvez sentimentos tão profundos não devessem ser escritos. Intimidade sem espaço para divisões... Mas hoje decidi que quero ir um pouco mais além. Muito mais do que escrever, quero a seriedade de jurar! Quero a liberdade de me derramar inteiro, gota por gota até encher, mesmo que por alguns segundos, o mundo com meu puro egocentrismo. Sei que não conseguirei, mas mesmo assim quero a oportunidade de tentar.
Pensei em tudo o que sinto... Pensei naquilo que eu sou e não consigo transcrever. Muito daquilo não tem nome. Muito daquilo é vertigem pura, o que me assusta um pouco. O desconhecido me assusta, e isso me torna ainda mais clichê.
Não sou como o soldado ansioso que vai para a guerra com o objetivo cego, mesmo que muitas vezes contra sua vontade, para matar ou morrer da maneira mais precipitada possível. Eu não. Prefiro as sutilezas do mundo. Prefiro a viscosidade quase obscena da língua e toda a sua perfídia. Prefiro a aparente inocência da palavra que instala-se no inconsciente... Na alma! E este é o verdadeiro estrago. Este é o verdadeiro domínio. Aquele contra o qual não há defesa. É tão satisfatória a vitória que não se percebe!
Não me anuncio, me insinuo. Sou a torneira que goteja inofensiva e vagarosamente alaga. Na surpresa... Na surdina. Sou exatamente como o balão cheio de ar no exato momento em que estoura pelo excesso. Não me contenho! Sou do mundo e ao mundo me entrego, e é de todo o excesso gritante, aquilo tudo que só faz extravasar, que tiro a experiência e o aguçado entendimento, apenas no silêncio de um olhar... Sim, eu realmente estou convicto de que sou o mundo. Assim como cada um de nós. Mas sou um mundo tão pequeno, que suporto muito pouco, se comparado à grandeza com a qual o mundo poderia me completar. Sou finito. Limitado por apenas uma vida que não é o bastante. Nunca é. E ao sopro que me estoura, chamo sentimento.
Sentimentos são quase como bolhas que estouram pelo ar, ou talvez até sejam parecidos com um raio. Primeiro enxerga-se o relâmpago, somente luz sem grande intimidação, depois escuta-se o barulho ensurdecedor do trovão... O mesmo barulho medonho que põe as crianças assustadas debaixo da cama.
Ah, Sentimentos são tão inconstantes! E é somente quando escrevo que me sinto um pouco mais duradouro do que uma ínfima batida de coração. Batida. Choque. Chocam-se meus ideais com minha realidade, Meus pensamentos com meu cárcere privado. Tudo explode-se em fogosa e desconcertante confusão. Fogo. E todas as pontes, ou qualquer morada sólida, consomem-se em chamas; como num lindo show de fogos até o alvorecer! Mas dos fogos sobram as cinzas, e com elas ninguém se importa.
Sou diariamente abusado pela besta que me devora e culpa-me pelo desejo imposto e reprimido; a eterna fome de fruto proibido, aquele que meus lábios jamais irão provar.
Não desejo muito, nem espero que o mundo me compreenda (Aliás, o mundo me compreende, nos damos muito bem. Refiro-me as pessoas, essas sim são difíceis de lidar). No fundo, bem no fundinho mesmo, espero apenas que um dia a aurora chegue mostrando a beleza viva do dia, sem acabar com a tranqüilidade serena da noite.

Foto por: Tuane Eggers

terça-feira, 26 de maio de 2009

Analgesia














Hoje dói como nunca.
Teu nome é ferida aberta em minha carne
E minhas vísceras expostas exalam um odor desagradável.

Não é belo o que te ofereço.
Aliás, não é comum.
É único.
Mas é estranhamente verdadeiro,
Friamente obsceno.
Puríssimo e já pútrido sentimento de amar!


Deus do céu!
Por quê criastes algo tão maravilhoso
E ao mesmo tempo tão devastador?
Dir-me-á que é castigo,
Ou que este paradoxo é apenas mais uma
Das desgraças que fogem de teu controle?

O que pode fazê-lo parar?
Que veneno mata um sentimento sem pudor?
Que analgésico conseguiria aliviar
A dor...?
Dor delirante de profano amor!

Foto por: Tuane Eggers

segunda-feira, 25 de maio de 2009

A prostituta

Há muito, seu corpo era apenas uma festa. Uma festa vulgar como qualquer outra, onde as pessoas entravam, divertiam-se, deleitavam-se e iam embora, sem sequer olharem para trás, quando o prazer chegava ao fim. Já não era um destino, era um caminho. O motel na beira da estrada. Efêmera, mas não como um amor. Como um orgasmo. Era um campo tão fustigado; tão pisoteado que já não era nada, se não, terra infértil.
Era madrugada, e ela, ao invés de dormir, estava voltando para casa, com seu velho sobretudo preto e uma cigarrilha queimando entre os dedos. Sentia-se cansada de tanto caminhar e sentou-se no banco do terminal rodoviário por onde passava. Olhou para os lados, naquelas alturas da madrugada não existiam muitas pessoas por ali: apenas algumas poucas que, como ela, guardavam histórias incrivelmente interessantes e obscuras sobre o rumo peculiar de suas vidas.
Em um canto estava deitado um pobre mendigo que dormia tranquilamente. Mesmo passando frio. Mesmo sentindo medo. Mesmo não querendo mais acordar. Como poderia aquele homem ser tão relaxado a ponto de dormir ali? A verdade é que ele não dormia por sono e tranquilidade, dormia por um cansaço avassalador: por pura exaustão; pensava ela. Sentiu compaixão daquele ser. Desvendara sua mente, invadira seus sentimentos mais profundos. Talvez o estivesse julgando erroneamente, talvez não; mas, de fato, havia se envolvido de uma maneira muito mais profunda, com ele, do que com seus diversos clientes daquela noite.
Tragou a cigarrilha e caminhou com passos leves até ele, enquanto despia seu casaco. Delicadamente, pousou-o sobre aquele homem, tendo todo o cuidado para não acordá-lo. Fizera algo que poderia ser chamado de “boa ação”, mas não conseguiria suportar se fosse reconhecida por isto.
Sem seu casaco, percebeu como estava frio. Tremeu um pouco, mas recusou-se a se arrepender do que fizera. Sentou-se novamente no mesmo banco, alisando-se com seus braços na tentativa de produzir um pouco de calor. Tragou a cigarrilha novamente, sentiu a fumaça quente espalhar-se em seus pulmões e então soltou-a. Com seus olhos, vasculhou mais uma vez o lugar procurando outra história; outro ser digno de sua atenção, que por mais indigna que fosse, era sua.
Viu outras mulheres que, como ela, também vendiam o seu amor. Não se deteve nelas, não porque não fossem interessantes, mas porque eram complexas demais, pois, apesar de saber que eram tão complexas quanto qualquer outro ser humano e suas vivências, o fato de incluir-se naquele meio tornava-a imparcial em seu julgamento. Sorriu, tragou e desviou o olhar. Acabada aquela cigarrilha, acendeu outra e fumou para manter-se aquecida.
Viu pessoas esperando por um ônibus. Iriam viajar, talvez, para longe dali, talvez buscando uma vida melhor, talvez para visitar pessoas queridas ou talvez por puro lazer. Sentiu uma ponta de inveja. A mesma inveja que sentia sempre ao ver um pássaro voar. Um vira-lata vagando pela cidade. A fumaça que saia de sua boca. Um balão de gás que escapa das mãos de um menino descuidado e sobe livremente, como um dia ela havia presenciado. Naquele dia, não pode conter um riso gostoso de prazer ao olhar para aquele balão amarelo cheio de liberdade.
Gostava de fechar os olhos e imaginar-se como uma linda águia ganhando os céus, subindo no topo da montanha mais alta e cantando com toda a sua voz, mesmo que não soubesse cantar. Ah! Como era delicioso sonhar com liberdade!
Tragou novamente e observou o banco onde estava sentada. Era velho. Sujo. A madeira estava riscada e era possível ler diversos nomes, frases e símbolos ali gravados. Todos deixados por pessoas que um dia haviam passado por ali, talvez, sentadas no mesmo lugar onde ela estava agora. Algumas felizes, outras desesperadas. Algumas, provavelmente, haviam dormido ali, talvez durante dias. Quantas pessoas aquele banco não havia descansado e visto quando partiram como se nunca houvessem existido? Essas pessoas deixaram suas marcas e foram embora deixando-as para trás, com uma total indiferença. Mas elas ainda continuavam ali, mesmo após tanto tempo.
De repente, foi como se tivesse visto seu próprio rosto naquele banco. Quanta coisa tinham em comum! Quantas partidas haviam amargado! Quantas ausências haviam chorado! Ambos tinham a mesma sensação de passageiros e desnecessários. Ambos eram, primeiro, convenientes; depois, úteis; e, por fim, já não eram mais nada.
Tragou sua cigarrilha e deitou-se naquele banco. Sentiu-se abraçada. Amou e em troca sentiu-se amada. Não estava mais em um banco, estava com um amigo. Talvez até mais do que isso: Estava enamorada! Encontrou naquele banco seu par único no mundo. Encontrou nele a única pessoa que seria capaz de entende-la. Sentiu prazer como jamais havia sentido com qualquer homem em anos de profissão.
Enfim, dormiu. Não como o mendigo, por exaustão, mas sim devido à enorme paz e segurança que sentia em seu peito. Acordou quando os primeiros raios de sol tocaram sua pele. Sorriu. Sorriu sinceramente, sentindo-se incrivelmente bem e descansada como há tempos não se sentia. Entendeu que era feliz. Que a felicidade, não estava em lugar algum, que não dentro dela mesma: Afinal, onde mais encontraria prazer maior se não em si própria? No banco, descobrira a si. Entendeu que não era sozinha, ou que pelo menos, não seria sempre assim.
Encheu-se de esperança, levantou e voltou para casa. Tomou um banho, a alma já estava lavada, agora faltava o corpo. Sentiu-se acariciada pela água quente, envolvida pela toalha macia e cobriu a nudez de seu corpo com roupas novas e bonitas. Saiu novamente para tomar um café; decidiu tomar o caminho pela beira da praia.
Entrou no café. Pediu um cappuccino e tragou outra cigarrilha. Estava lendo o jornal, quando o barulho da sineta pendurada à porta desviou sua atenção.
Um homem entrou. Era jovem, bonito e usava um belo chapéu panamá preto. Ela sorriu para ele. Ele sorriu para ela e andou em sua direção, perguntando gentilmente se poderia sentar-se em sua mesa. Ela aceitou animadamente, não estava acostumada a tanta cortesia. Juntos, conversaram, deram risada, falaram sobre tudo e até trocaram olhares maliciosos. Quem era ele? Talvez mais um cliente, talvez não.

Foto por: Tuane Eggers

domingo, 24 de maio de 2009

O ladrão de estrelas

A noite era escura. Tão escura quanto uma noite poderia ser, se não fossem pelos pequenos pontos luminosos, por nós chamados de estrelas, que brilhavam em seu manto negro. Eram lindos. Especialmente quando vistos através das janelas fechadas de seu quarto fechado.
Durante os dias, ele dormia profundamente. Mas, quando o sol se punha, sentava-se diante do vidro e olhava para o céu durante a noite inteira. Dia após dia, ele dormia e noite após noite, ele sonhava acordado.
Observara as estrelas durante tanto tempo a fio, que já as conhecia de cor. Conhecia-as de tal maneira, que havia até mesmo nomeado algumas delas: alguns dos seus pontos luminosos, como gostava de as chamar. E todas as noites o menino velava por eles. E todas as noites os seus pontos lhe lançavam um brilho especial, cada vez mais intenso.
Admirado, o menino resolveu pegar um deles para si. Encorajou-se durante noites, e a cada noite que ele não realizava seu desejo, os pontos brilhavam mais e mais, como se estivessem prestes a explodir. Brilhando, os pontos urravam para que ele os tomasse, e sonhando o menino implorava para que um dia tivesse coragem de ir ao seu encontro.
Ensaiou-se, e de repente, num surto de coragem, quebrou a janela do seu quarto e jogou-se janela abaixo, sem se importar com a altura por ele desconhecida. Ficou surpreso: Não caia, voava! Não chorava, sorria! Não temia, deleitava-se. Aproveitou a liberdade no céu noturno durante algumas horas, observou seus pontos de perto. Cheirou-os. Acariciou-os. Abraçou-os, e, então, sorrateiro como uma sombra, pegou um e escondeu sob sua camiseta, rente ao peito.
O objeto brilhava intensamente! Brilhava tanto, que quem o vira passando naquela noite poderia jurar que havia visto um anjo de coração dourado! Amou tanto aquele ponto, que decidiu guardá-lo para sempre junto de seu coração e, juntos, ambos brilhavam: Estrela e coração. Não havia mais como separá-los. Não sabia o que era, mas sabia que seu desejo de possuí-lo era maior do que sua própria razão. Já não era mais um desejo, era uma necessidade torturante! E assim, todas as noites, nosso pequeno ladrão de estrelas continua adicionando mais um ponto brilhante à sua coleção... Dentro do seu coração.

Foto por: Tuane Eggers

*1° lugar na categoria contos, no concurso literário Novos talentos - Escritos e Escritores II, promovido pela Alivat - Lajeado/RS