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sábado, 9 de junho de 2012

O réu

Mas em algum lugar do mundo um noturno ladrão de abraços sorri com o coração quente e a consciência pesada. Por favor, peço a todos que não o julguem! Ele não é uma pessoa de todo má. Digo de todo, pois um pouco demoníaco todo mundo é. Entendam que a noite estava fria e o seu coração também. Entendam que a respiração profunda e entrecortada, o cheiro dos corpos que suam em repouso e o ronronar de gato adormecido eram mais potentes que todos os chocantes fios daquele lençol-cadeira-elétrica-térmico. Imagine agora que um braço quase envolve sua cabeça – você bem gostaria que assim o fizesse – e que seus olhos frente a frente transbordam as informações que não pertencem ao reino da palavra – se eles não estivessem fechados de bebida e de cansaço. O único fato é que o peito abre-se feito um travesseiro e o coração com suas batidas miudinhas sussurra lá de debaixo da camisola – Vem tu. Vem tu. Vem tu. Na calada da noite nem mesmo os pássaros ousam fazer barulho, portanto cada suspiro sagrado é segredo compartilhado e diante disso tudo só lhe resta dobrar-se de fé. E é aí que a sua cabeça pende para frente... Bem devagarzinho. De maneira quase involuntária – especialmente quando o fino fio do teu sonho se romper - a cabeça pende como a de um bicho pedindo carinho aos pés de mamãe. Não se ousa respirar demais para não assustar o seu peito que então nos acolhe durante segundos de sereno violeta. O cheiro no nariz, o sussurro no pé do ouvido o balanço calmo de sua respiração e, enfim, o maior sorriso do mundo estampado no rosto do rapaz - Naquele momento te juro que a gente brilhou, mesmo que teus olhos jamais o tenham visto.
Por isso digo-te com toda a convicção que ele não é culpado. Sua inocência justifica-se nos princípios bíblicos do amor eterno e é de lei que se o coração queimou naquele dia, nosso sangue agora é vinho santo de milagre. Não o crucifiques, por favor. Se por acaso o condenares a morte nas suas cadeiras elétricas ou deixá-lo preso para sempre debaixo do seu pesado calcanhar, talvez devesse também pisotear como quem dança sobre as tulipas todas que ninguém cuidou e acertar suas contas com os céus que fazem os filhos como o pai que os criou: perdidos.


Foto por: Tuane Eggers

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