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terça-feira, 10 de novembro de 2009

Para sempre

Não resisti mais. Entreguei-me totalmente ao meu desespero e corri até o telefone. Agarrei-o com uma urgência de morte, disquei os números com um desespero fatal, ouvi o barulho da chamada com uma ansiedade apavorante. O que eu faria? E se ela atendesse? E se ela não atendesse? Talvez ela adivinhasse que era eu, como costumava fazer há tempos atrás.
Senti-me estúpido. Por que após tanto tempo, quando tudo seguia normalmente, esse desejo maluco me consumiu, como antes? Deve ter sido o “para sempre” que lhe disse tantas vezes, rendido aos encantos de seus beijos. Caí na pior das armadilhas do amor: a ilusão da eternidade! Totalmente envolto nessas artimanhas, jurei. Jurei com toda a minha alma que a amaria para sempre, que meu coração jamais seria capaz de bater por outra pessoa, e que eu não sofreria por ninguém mais, que não ela. Dito e feito: desafiei o poder das palavras e elas agora me fazem refém. Uma vez proferida, a palavra não volta jamais, tampouco suas conseqüências catastróficas. Agora eu sou obrigado a amá-la, mais do que tudo, até o dia de minha morte.
Até o dia da minha morte... É tempo demais! É um egoísmo sem tamanho, pois não me restará tempo para mais nada: nem mesmo para mim! Quando eu respirasse fundo, e sentisse como se, finalmente, houvesse encontrado a liberdade, essa necessidade me tomaria, exatamente como hoje, esmagaria minhas resistências e me jogaria novamente nesse fosso sem saída. Eu poderia até resistir e não procurá-la, mas o preço disso seriam os terríveis dias de tormenta, onde eu seria assolado pelo fogo lancinante que me torturaria até que eu caísse naquela mesma letargia temporária de sempre. E eis-me refém do “sempre” novamente. Sempre amante, sempre letárgico, sempre insatisfeito, sempre assolado.
Ela atendeu. ”Alô?”. Senti uma corrente elétrica percorrendo por meu corpo inteiro. “Alô?”. Aquele alô. O meu alô. O alô que eu já havia ouvido, no mínimo, três vezes ao dia. O mesmo alô que após algum tempo havia se transformado em “Oi amor!” e agora voltara a ser um alô.
“Quem fala?”. Quem fala? Quem fala? Como ela pôde não reconhecer o meu silêncio? Meu respirar? Seria possível que ela já tivesse erradicado qualquer lembrança dos meus trejeitos da sua memória? A idéia doeu. Doeu como apenas uma idéia ruim pode doer: como um corte profundo no cérebro... Na alma. Chorei. Não resisti ao grito de pavor que vibrava por todo o meu ser, o máximo que pude fazer, foi condensá-lo em uma única lágrima e uma fungada.
Ela respirou fundo do outro lado da linha. “É você, de novo? Quando é que você vai parar com isso? Já faz mais de um ano que terminamos!” Ela me reconheceu! Reconheceu minha lágrima e minha fungada. Por algum motivo, isso me causou prazer e realização. Eu ainda estava na memória dela. Um incômodo, mas, ainda assim, eu existia. E existiria assim para sempre! Sorri e desliguei o telefone.
Corri para o quarto e joguei-me sobre minha cama. Estava feito! A maldição estava confirmada. Como sempre, o “para sempre” continuava a nos assombrar: continuava quase matando-me de desejo, e também quase matava a ela, mas de irritação.
Esse é o problema com “para sempre”: é lindo quando dito entre beijos e devaneios, mas terrivelmente cruel ao não abandonar as ruínas daquilo que não deu certo. Essa sim é a verdadeira assombração.
De qualquer maneira, eu estava pronto para seguir minha vida por mais algum tempo, então me recompus, fui até a cozinha e beijei minha esposa. “Te amo” ela disse. “Para...” Interrompi-a antes que terminasse a frase. “É o bastante” disse eu, ao calá-la com um novo beijo.

Foto por: Tuane Eggers